Artesanato sustenta 8 milhões de pessoas no Brasil e ganha plataforma

Paraíba

Um dos setores da economia da cultura que está em fase de fortalecimento em todo o país é o artesanato. Além de contribuir para o desenvolvimento econômico, estreita os laços de comunidades e, de quebra, resgata tradições culturais, mantendo viva a história local. No Brasil, estima-se que oito milhões de pessoas vivam do artesanato. Na Paraíba, cerca de sete mil artesãos estão vinculados ao Programa do Artesanato da Paraíba (PAP).
O secretário de economia da cultura do Ministério da Cultura (MinC), Mansur Bassit, defendeu que o artesanato, por envolver os mestres de comunidades tradicionais, é uma forma de preservar as raízes do país por meio da criação e produção de arte. Além disso, o artesanato representa valores regionais, crenças e culturas que retratam as danças, festas, trabalho e religiosidade de povos diversos.
“O MinC desenvolveu o Plano Setorial do Artesanato 2016-2025 para fortalecer o setor no país. O plano define políticas públicas para o setor e entende o artesanato como preservação do patrimônio material e imaterial. O artesanato é um setor importante para a economia da cultura porque gera renda, emprego, subsistência, inclusão e cidadania”, argumentou Bassit.
Dentro do plano, até o final do ano, o MinC vai mapear a cadeia produtiva do artesanato brasileiro em todo o País. Outro objetivo é promover a qualificação dos profissionais que atuam no setor até 2021.
“O artesanato, enquanto economia criativa, também gera pertencimento entre os membros da comunidade. O conteúdo cultural produzido é a história do país, das comunidades e das regiões”, afirmou o secretário de economia da cultura do MinC.
Para Bassit, um dos grandes impedimentos no desenvolvimento deste setor é saber onde estão as produções no país. “Ainda temos essa fragilidade para conseguir os números do artesanato no país. Eles são importantes para que a política pública vá direto ao ponto. Então, falta fortalecer o mapeamento, mas também a capacitação desses artesãos”, afirmou
“Uma capacitação em tecnologia, por exemplo, é importante para que seja usada a serviço do setor, com orientações desde como comercializar uma mercadoria até como empregar e não usar mão de obra infantil, por exemplo. Como remunerar justamente, usar recursos naturais sustentáveis, desenvolver o lado artístico, mas também o negocial. Tudo isso passa pela capacitação”, frisou Mansur Bassit.
MinC lança plataforma digital em parceria com Artesol
Uma das metas contidas no Plano Setorial do Artesanato é implantar uma plataforma on-line que reúna informações e dados do artesanato brasileiro, além de promover o diálogo e a cooperação entre os profissionais do setor. “A plataforma digital contribui para a valorização do artesanato, principalmente por reunir os grupos da cadeia produtiva, com a origem de cada um, divulgação de experiências e produtos”, afirmou o secretário de economia da cultura do MinC.
A coordenadora da Rede Nacional do Artesanato Brasileiro (Artesol), Josiane Masson, foi uma das editoras da plataforma e que, pessoalmente, visitou diversos grupos e associações de artesanato espalhados pelas cinco regiões do país que integram a rede. “Enquanto pensamos numa maneira de contribuir com o setor de forma mais relevante, percebemos que ele é desarticulado e que faltavam informações organizadas, um banco de dados com linguagem agradável e acessível, para que o leitor possa entrar em contato com a realidade do artesão de jeito belo e de modo a valorizar ainda mais as atividades e ofícios”, explicou.
O fato de comumente o artesanato ser visto como uma mera atividade que gera renda para quem não tem emprego foi um estigma que incomodava a coordenadora da Artesol. “Víamos essa desconexão com o que realmente o artesanato representa enquanto bem cultural. Além disso, o setor não conversa entre si nem se conecta a rede, o que é essencial para conseguir mais projeção. A inclusão digital é muito importante para construir uma rede de contatos e troca de experiências”, afirmou Masson.
A plataforma digital ( http://artesol.org.br/ ) traz, em seu mapeamento, 100 grupos ou associações de artesões de todos os estados. Quatro entidades da Paraíba integram a rede: a Associação dos Artesãos de São João do Tigre (Assoarti), Associação de Artesãos de Sítio Riacho Fundo, Associação dos Artesãos de Monteiro e Cooperativa das Bordadeiras de Alagoa NOVA (Cooban).
“Fizemos uma pesquisa profunda dos contextos dos grupos para poder criar o perfil de cada um na plataforma. Optamos pelos que estão mais organizados. Por meio da plataforma, também vamos mediar o contato inicial dos grupos com potenciais clientes. Além disso, 54 lojas foram mapeadas e o conteúdo delas também pode ser encontrado no site”, explicou Josiane Masson.
Além do mapeamento dos grupos e associações de artesãos do país, a plataforma traz conteúdos de reportagem com a produção desses artesãos, histórias de vida inspiradoras e o universo do artesanato de modo geral, além de uma seção que aborda o comércio justo.
“A plataforma vai servir também para pesquisadores, estudantes e quem quiser consumir. Uma segunda etapa da plataforma vai ser a implantação de uma seção de capacitação onde os artesãos terão acesso a aulas, cursos e tudo que possam auxiliar nas diferentes necessidades de desenvolvimento”, explicou a coordenadora da Artesol.

Celeiro Espaço Criativo é vitrine em JP
O Celeiro Espaço Criativo foi inaugurado em janeiro deste ano, por meio do Programa João Pessoa Artesã (JPA) e fica localizado no bairro de Altiplano, em João Pessoa. O espaço veio como reforço de peso ao título de cidade criativa concedido pela Unesco à capital paraibana no fim do ano passado. O título reconhece João Pessoa como cidade que fomenta o artesanato e a arte popular.
“Desde 2013, a cidade vem potencializando o artesanato produzido aqui e, portanto, temos avançado bastante com a política efetiva de estímulo ao artesanato. Um caso de sucesso foi o das Sereias da Penha, assim como outras ações na perspectiva de economia solidária com mulheres nos bairros da cidade. Neste sentido, ainda, o Celeiro vem suprir uma demanda muito antiga de espaço permanente de difusão, exposição e comercialização dessa produção de João Pessoa”, afirmou a coordenadora do JPA, Maísa Cartaxo.
Conforme Cartaxo, o artesanato no estado conta com dois grandes salões, sendo um em Campina Grande no meio do ano e outro em João Pessoa no início do ano. “Há uma sazonalidade, mas com o Celeiro o artesanato local tem vitrine permanente, com possibilidade efetiva de geração de renda”, frisou. Em três meses, o Celeiro recebeu mais de oito mil visitações. Em termos de volume arrecadado, cerca de R$ 40 mil foram vendidos em peças de artesanato neste período. Pelo menos 140 artesãos expõem trabalhos no local.
“A gente tem maciçamente, trabalhos de cerâmica, renda renascença, crochê, tricô artístico, esculturas de madeira, biojoias de escama de peixe, fuxico, bordados, entre outras manualidades que expressam a nossa cultura. Temos tanto o artesanato de raiz, com matéria-prima de raiz, como trabalhos que chamamos de industrianato, mais customizado. Estamos bastante felizes com o retorno. Os artesãos estão satisfeitos com o espaço e os visitantes sempre afirmam que era um lugar necessário na cidade”, explicou Maísa Cartaxo.

Artesãos expõem no Celeiro
O artesão Robério Eius desde jovem demonstrou interesse pelo trabalho manual, mais especificamente utilizando a madeira como matéria-prima principal inspirado por seu avô, que era carpinteiro. “Anos depois, ingressei no curso de Arquitetura e Urbanismo e durante as aulas conheci alguns arquitetos artistas que executavam móveis e utensílios domésticos utilizando a madeira, e acabei me identificando muito com essa área”, contou.
Quando decidiu viver de sua arte, há seis anos, percebeu que quase toda a madeira bruta disponível no mercado tem origem duvidosa. “Eu não quis contribuir de certa forma com o financiamento do desmatamento ilegal. Resolvi não comprar mais madeira, somente reciclar, utilizando árvores urbanas caídas, podas e madeira de demolição. Meu trabalho é artístico, também tido como um artesanato contemporâneo. Eu faço esculturas e utensílios doméstico, onde procuro sempre implementar elementos de nossa cultura como a caatinga, o mangue e movimentos culturais”, explicou.
Para o artesão, a maior vantagem do trabalho é sentimental. “O amor pelo que faço. Não tem tantas vantagens olhando somente pelo lado financeiro. Porém, o artista paraibano tem bastante espaço de trabalho, pois temos vários eventos e feiras anuais, como o salão de artesanato, e ganhamos também esse ano um espaço da PMJP, o Celeiro Criativo”, disse.
A professora Preta Souza, por seu turno, trabalha com o crochê e desenvolveu uma técnica na qual o tecido não perde a dureza. “Amo artesanato desde pequena, mas somente em 2014 fiz um instagram sem pretensões de ser comercial. Hoje, tenho mais de 27 mil seguidores. Faço sousplats e toalhas de lavabo em crochê. Com o tempo, a demanda foi aumentando e precisei de colaboradoras, já que meu trabalho é manual”, afirmou.
A artesã, que já havia realizado uma oficina na escola onde leciona, na comunidade do Timbó, acabou ‘recrutando’ duas estudantes e uma ex-aluna, que atualmente trabalham com ela. “É ótimo para a auto estima delas, porque elas acreditam na própria capacidade. Além disso, elas conseguem gerar renda e ajudam dentro de casa. Uma delas comprou um fogão para a mãe e outra vai comprar uma máquina de lavar, por exemplo. O artesanato é valorizado aqui, mas nossas maiores demandas são do Sul e Sudeste”, contou Preta Souza.
Celina Modesto – Jornal Correio da Paraíba