Moro dá pistas de ser candidato, diz que Bolsonaro não admite o contraditório e que não avançou no combate à corrupção

Destaque Fábio Cardoso Paraíba

Assisti atentamente a entrevista do ex-ministro da Justiça, Sergio Moro, veiculada agora há pouco no Fantástico, na Rede Globo, e vi naquele ‘depoimento’ um discurso de um futuro candidato à presidência da República. O script da entrevista estava editado. Perguntas ‘contundentes’ ao estilo da Globo, respostas sem muita objetividade em seguida, mas todas colocadas com muita inteligência para jogar para a galera.

O que ficou claro, na minha opinião, é que Sergio Moro teria dado mais um passo para avançar na pretensão, cada vez mais evidente, de que pleiteia chegar ao Planalto. Jamais se colocou como uma pessoa omissa a tudo que estava acontecendo nesse governo, deixando claro na entrevista, que se colocava apenas com uma pessoa de governo, que, até o seu limite, curvava a cabeça a tudo que o presidente Jair Bolsonaro dizia e fazia. Admitiu estar desconfortável naquela lamentável reunião ministerial onde se ouviu de tudo um pouco. Ele ficou absolutamente em silêncio e ainda saiu mais cedo.

Ser ou não ser ‘papagaio’

“Eu acho que a minha lealdade ao próprio presidente demanda que eu me posicione com a verdade, com o que eu penso, e não apenas concordando com o presidente. Se for assim, não precisa de um ministro; precisa de um papagaio”.

Não foi a ameaça de ter cabeças rolando, muito menos a troca forçada de nomes do Polícia Federal que teriam determinado a saída de Moro da Justiça. É como se fosse em um casamento, que nunca se acaba de uma hora para outra. O casamento de Moro com Bolsonaro foi um dos maiores equívocos republicanos dos últimos tempos. E o ex-ministro ainda deixou algumas pistas da ditadura imposta pelo presidente a serem colocadas sob investigação.

Não houve arrependimento

“Entendi que tinha uma missão importante a realizar. Não (me arrependo de assumir ministério) de forma nenhuma. Fiz uma escolha muito clara. Na época, ela estava justificada. Fiz uma escolha também muito clara, e espero que as pessoas compreendam, quando saí do governo”.

Não avançar no combate à corrupção; promover conspirações a partir de um esquema de informantes privados; se alinhar politicamente com partidos e parlamentares com passado inapropriado (Centrão); promover ameaças ao legal exercício democrático de instituições; mostrar um governo que não admite o contraditório; estimular o uso de medicamentos (cloroquina) sem comprovação científica e algo que ameaça a vida de pacientes; incentivar aglomerações e desobediência civil contra o isolamento social; e propagar a necessidade do povo se armar.

Moro não está santo nesse processo. Após uma outra série de palavras sabiamente bem colocadas, o ex-ministro se apresenta sim como uma opção para as eleições presidenciais. Entretanto, tem a antipatia da esquerda, que não o perdoa por ter colocado Lula e seus auxiliares na cadeia, e também deixou de contar com o apoio da maioria dos seguidores de Bolsonaro – inclusive, na entrevista ele cita e pede desculpas a esses seguidores. Basta saber quem irá querer apostar nessa candidatura com uma personalidade já tão controversa no cenário político brasileiro.

Sobre possível candidatura

“Nós estamos no meio de uma pandemia muito grave, muito séria. Aproveito para externar minha solidariedade a famílias que perderam entes queridos. Acabei de sair do governo, vou ter que reinventar minha vida. Toda essa turbulência decorrente da minha saída, da pandemia… Estou encontrando uma maneira de me posicionar. Mas sempre disse que quero continuar contribuindo, na área privada, no debate público, sobre essas discussões sobre o país.”.

Fábio Cardoso