O sentimento de decepção do brasileiro em relação à classe política, provocado principalmente pelos inúmeros escândalos de corrupção, pode ter uma consequência ainda pior para o futuro do país, de acordo com o ex-ministro da Fazenda no governo de José Sarney, Maílson da Nóbrega. Na tentativa de fugir do fantasma da corrupção, o próximo presidente da República corre o risco de ser alguém considerado “novo”no cenário – o que é considerado um “desastre” para Nóbrega.
Além disso, ainda há a influência da recessão econômica que demora a regredir. “Há um sentimento de decepção em decorrência da desastrosa incompetência do governo Dilma e dos escândalos de corrupção. Isso pode influenciar a busca de um nome novo, fora da classe política e não envolvido em corrupção. Se isso acontecer, será um desastre para o país. Infelizmente, muitos pensam que basta escolher um ‘bom’ nome, sem se dar conta de que tão difícil quanto se eleger é governar um país complexo e carente de reformas impopulares”, comentou.
Deste modo, Nóbrega frisa que exercer um mandato de presidente da República requer mais do que paciência para lidar com as constantes dificuldades, mas também habilidade para conduzir negociações políticas complexas e liderança para ter apoio da sociedade. “Essas qualidades não surgem da noite para o dia. Resultam de longos anos de exercício de cargos públicos e da atividade política. Um novato pode botar tudo a perder e correr o risco de não terminar o seu mandato. Pode-se não gostar, mas em todo o mundo os chefes de governo costumam ser escolhidos entre experimentados e hábeis políticos, não entre noviços”, salientou.
Entretanto, quem estiver esperando a campanha eleitoral para verificar os temas mais caros aos futuros candidatos, deve ter em mente que, de modo geral, os temas espinhosos são evitados – a exemplo de Reforma da Previdência e Privatização.
“Os compromissos com temas impopulares costumam ser assumidos no discurso de posse do vencedor. Nesse caso, se o ganhador for um candidato de centro favorável ao prosseguimento das reformas de Temer e de sua ampliação, os temas econômicos tendem, a meu ver, a abranger cinco campos: reforma da Previdência, reforma tributária, reforma do Estado, privatização e investimentos privados em infraestrutura”.
De acordo com análise do economista e ex-ministro da Fazenda, a economia continua em processo de recuperação da maior recessão da história, mas em ritmo inferior ao esperado. A expectativa é de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) em 2,8% neste ano. “As eleições presidenciais e seus riscos começam a entrar no radar dos investidores, mas isso tem afetado apenas a taxa de câmbio. O crescimento e a inflação não devem sofrer. Se elegermos um populista de esquerda ou de direita, o cenário tende a piorar, mas suas consequências serão mais sentidas a partir de 2019”, avaliou.
Operações não movimentam mercado
A Operação Lava-Jato e até mesmo a prisão de Lula afetaram pouco a economia, de acordo com avaliação do ex-ministro Mailson da Nóbrega. Por um lado, a operação já está em curso há mais de quatro anos, o que não representa novidade aos investidores. Por outro, a prisão de Lula já era esperada.
“Nos dois casos, não houve reação digna de nota. Quanto à Lava-Jato, só afetaria as expectativas dos mercados caso aparecesse uma denúncia muito forte e convincente contra Geraldo Alckmin. Os mercados reagiram mal, pois veriam, nesse caso, a perda de esperança de eleger um presidente reformista. Haveria, na visão dos investidores, ampliação das chances de escolha de nomes desastrosos, dentre candidatos de esquerda”, afirmou.
Ainda existe a briga entre esquerda e direita?
Nóbrega crê que os conceitos de direita e esquerda estão ultrapassados e que, no Brasil, ninguém assume ser de direita sob o risco de “pegar mal”. “A grande maioria se diz de esquerda ou de centro-esquerda. No pós-guerra, os partidos de esquerda europeus fizeram seu aggionrmento (atualização). A grande maioria abandou o credo marxista, abraçando a democracia e a economia de mercado, isto é, o capitalismo”, afirmou.
O ex-ministro citou o caso da China que, mesmo afirmando ser comunista, possui características tipicamente capitalistas. “Politicamente, é um país autoritário. Um líder espanhol considerado de esquerda, Felipe Gonzalez, que se tornou primeiro-ministro à frente do Partido Socialista Operário Espanhol, dizia que o déficit público não é de direita nem de esquerda. É apenas déficit”, explicou.
Desafios
Diversas reformas consideradas impopulares são os principais desafios que o próximo governo deverá enfrentar a partir do próximo ano. “Precisa começar com a reforma da Previdência para evitar a insolvência fiscal, a volta da inflação sem controle e a destruição da capacidade de crescimento da economia. Precisará avançar com a reforma tributária, a privatização em larga escala, exceto de vacas sagradas como a Petrobras e o Banco do Brasil, atrair capitais privados nacionais e estrangeiros para a infraestrutura, entre outros. E tudo isso negociando com um Congresso fragmentado. Não será fácil”, destacou Mailson da Nóbrega.
Celina Modesto – Jornal Correio da Paraíba